Noites Submersas

Que procuras no tempo, quando te socorres da carne!Que procuras no tempo, que não se procure num olhar!Então socorres-te do tempo, para explicar a carne...

segunda-feira, abril 18, 2005

Pablo Neruda - 100 sonetos de amor - LXIX

De Noite, amada, amarra teu coração ao meu
e que eles no sonho derrotem as trevas
como um duplo tambor combatendo no bosque
contra o espesso muro das folhas molhadas

Noturna travessia, brasa negra do sonho
interceptando o fio das uvas terrestres
com a pontualidade de um trem descabelado
que a sombra e pedras frias sem cessar arrastasse.

Por isso, amor, amarra-me ao movimento puro,
á tenacidade que em teu peito bate
com as asas de um cisne submergido,

Para que as perguntas estreladas do céu
responda nosso sonho com uma só chave,
com uma só porta fechada pela sombra.

in, 100 sonetos de amor -LXIX, Pablo Neruda

sexta-feira, abril 08, 2005

Hoje

Fecho os olhos na anciã de te encontrar,
Por entre cada um dos meus pequenos pensamentos,
E nessa busca eu me perco, encontrando-te.

Mas ao perder-me em cada uma das palavras ditas,
Tenho a noção que vou perdendo o chão que me sustêm,
Perdendo-me do tempo e de toda a minha realidade.

A certeza com que te busco, em cada encontro,
Que tão fugazmente me arrebata a alma,
Faz-me prender no suspiro da tua boca,
Ou, mesmo em todos os sorrisos que da tua boca que eu não vi.

Sinto o tempo em nós,
E o amanhã que não chega, para te poder encontrar,
Mesmo que hoje, estejas na minha memória
Ainda fresco como uma flor que desabrocha para a vida.

Hoje, não penso, senão em ti,
Hoje tive o teu corpo e a tua alma,
Num único instante em que te reconheci em mim,
E foi nesse mesmo instante, que soube me tinha perdido em ti.

Os gestos de um estranho, nas palavras de um conhecido,
Mas a distância quem a soma?
Esta, que nem distância...

A alma, este lugar vago,
Que tão pouco se ilumina,
Hoje irradia ao som da primavera,
Com um rebento que cedo irá desabrochar.

Sinto no ar, o perfume das novas manhãs,
E todo o meu ser se converte aos seus novos estímulos,
Perdendo-se do nó dessas amarras, que cortavam os meus pulsos.

Oh, estranho, que ainda não vi,
É estranho como plantas em mim,
Um sentimento, que há muito sentia desconhecido.

(Com um beijo especial, para um amigo, que magoei sem querer)

Soneto

Busque Amor novas artes, novo engenho
Pera matar-me, e novas esquivanças,
Que não pode tirar-me as esperanças,
Que mal me tirará o que eu não tenho.
Olhai de que esperanças me mantenho!
Vede que perigosas seguranças!
Que não temo contrastes nem mudanças,
Andando em bravo mar, perdido o lenho.
Mas, enquanto não pode haver desgosto
Onde esperança falta, lá me esconde
Amor um mal, que mata e não se vê,
Que dias há que na alma me tem posto
Um não sei quê, que nasce não sei onde,
Vem não sei como e dói não sei porquê.

in Sonetos,Luis Vaz de Camões

quinta-feira, abril 07, 2005

Mais um dia...

Mais um dia passou, mais um dia passou e as horas passaram no meu corpo, deixando as marcas dos segundos e dos minutos nos meus olhos e no meu ser.
Penso então, que não deixarei mais o tempo passar em mim, não quero as marcas das tristezas vãs como as de hoje, como as de ontem....
Paro para olhar, e sobre o meu ombro vislumbro o céu que se ergue sobre a varanda do meu quarto e respiro a noite que está preste a emergir, parece que todo o mundo se move á minha volta, mas não ouço mais que o silêncio de um pensamento, ou de vários, que ás vezes se atropelam no meu cérebro.
Mais um dia passou, mais uma noite chegou, acompanhada pelas estrelas e pela lua límpida que irradia de beleza no meu céu... sinto-me pequena, sinto-me parte do mundo que me rodeia em cada respiração, em cada olhar que divaga, ou em cada lágrima que espreita o mundo pelo meu rosto.
Fecho os olhos, o vento, sinto-o; no ar sinto o cheiro agradável da laranjeira que dorme no quintal lá do fundo, envolvida pela terra que a alimenta.
É tão agradável sentir, e cada momento não é apenas mais um.....

terça-feira, abril 05, 2005

Pensamentos

Meus, são meus estes pensamentos,
Estes pensamentos que me movem.
Bem, mas são tão loucos e impossíveis,
Que já lhes mostro a negação.

Sim, são meus esses pensamentos,
Penso em mim, neste instante,
E suga-me o tempo a distância num segundo,
Para me mostrar as portas que se abrem.

Meus pensamentos,
Misturas de amor, ilusão, fantasia e razão.
Movimentos fragmentados de propósitos.

Ninguém os vê,
Tenho-os como apenas meus,
Perdidos na ponta da língua
E guardados na caixinha da minha memória.

Um pensamento

És, tão frágil,
Tão subtil,
E mesmo assim, o teu olhar permaneceu
Uma lápide triste e fria.
E quando te olhava e
Te colhia nos meus braços,
Pensava poder salvar-te, enfim…
Plantar violetas e papoilas no jardim,
E sorver da manhã esses instantes teus,
Que se apartavam de nós.
Mas, ao mergulhar no teu olhar,
E ao roubar-te esse feitiço emoldurado,
Compreendi a tua palavra… mas não o teu beijo.
Então a alma sufocada,
Respirou….e vi-te enfim.
Eras essa personagem fugidia,
Que preferia não chorar, não amar, não sentir.
Olhei-te, respirei do teu ser
E julguei sentir-te,
Assim, tão simplesmente.

sexta-feira, abril 01, 2005

Manhã submersa

Esta Luz que nos rodeia,
Que passa e não se instala.
Olhamo-nos de frente
De olhos caídos e pesados,
A sonolência é um atraso.
Sinto o pavor do sentimento,
Cobrado em dobro pelo pedinte,
E na manhã submersa
O peso morto do teu caixão.
A tua sobrancelha, frange
E o teu olhar mudou,
Vejo o sangue, que te tinge o rosto
E me marca de veludo a alma.
A lua mudou de posição,
E com o teu cordel, teimas em puxa-la
Parece querer cair,
E com ela todo o meu corpo tombar.
Vá, vem tocar-me e olhar-me
Mergulhada nesta água transparente,
De olhos abertos e respiração trancada,
Esperando a vontade de emergir.